4ª Turma do STJ adia definição sobre taxa Selic para condenação por dívidas civis
A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça retomou nesta terça-feira (1º/6) um dos julgamentos em que se discute o afastamento da taxa fazendária (Selic) para correção de dívidas civis, conforme dispõe o artigo 406 do Código Civil. Mas não chegou a uma definição sobre o controverso e espinhoso tema.
O colegiado tem dois processos sobre a matéria em julgamento, ambos com relatoria do ministro Luis Felipe Salomão. Neles, ele já proferiu votos propondo que, em casos de dívida civil no âmbito do Direito Privado, o uso da Selic seja substituído por juros de 1% ao mês e correção monetária de acordo com os índices oficiais cabíveis a cada caso concreto.
O problema é que os dois casos não estão sendo julgados em conjunto. No primeiro, REsp 1.081.149, o voto do relator foi apresentado em 17 de novembro de 2020, e o julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Marco Buzzi.
O outro caso, REsp 1.795.982, teve julgamento iniciado em 15 de dezembro de 2020, cujo pedido de vista foi feito pelo ministro Raul Araújo. Este, na opinião de Salomão, é um processo mais propício à discussão da tese sobre o afastamento da taxa Selic para correção da dívida. Por isso, esperava que a retomada de ambos os casos se desse de forma conjunta, na mesma sessão.
Nesta terça-feira, no entanto, o ministro Marco Buzzi insistiu em ler o voto-vista no REsp 1.081.149. E divergiu do relator, por entender que a discussão sobre o índice aplicável para correção da dívida não foi devolvida pelo tribunal de segunda instância e, por isso, não pode ser analisada pelo Superior Tribunal de Justiça.
Ninguém mais votou porque o ministro Salomão pediu vista-regimental, já com aviso de que o caso será retomado quando o voto-vista do ministro Raul Araújo estiver pronto.
Jurisprudência?
Trata-se de mais um capítulo na longa discussão jurisprudencial sobre aplicação da taxa Selic em indenizações. Há um precedente da Corte Especial, no EREsp 727.842, em que a orientação firmada é a de que a taxa dos juros moratórios a que se refere artigo 406 do CC é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais.
O que o ministro Luis Felipe Salomão propôs foi um distinguishing (distinção) para os casos em que a dívida é por condenação civil. Segundo ele, a Selic é cabível para créditos tributários do contribuinte, mas não no âmbito do Direito Privado, pois não atualiza adequadamente os valores e seu cálculo inclui simultaneamente juros moratórios e correção monetária.
Por esse entendimento, a 4ª Turma chegou a afetar o REsp 1.081.149 para que a Corte Especial pudesse analisar esse novo recorte, mas o caso acabou desafetado após questão de ordem, por entender que a matéria não estava bem delimitada pelo que fora decidido pelas instâncias ordinárias.
Já no REsp 1.795.982, antes de o ministro Raul Araújo pedir vista, chegou a cogitar a afetação para que então a 2ª Seção logo analisasse a matéria. Na ocasião, os ministros da 4ª Turma concluíram que seria melhor o colegiado firmar uma posição antes de ampliar a discussão no STJ.
Por fim, a Corte Especial também vai julgar essa exata mesma matéria, já que o ministro Benedito Gonçalves admitiu embargos de divergência sobre o tema, recentemente, em março de 2021. O caso embargado foi decidido pela 3ª Turma do STJ, que manteve a aplicação da taxa Selic para correção de dívida civil.
Tese proposta
Para o ministro Salomão, o uso da Selic é considerado inconciliável para casos de dívidas civis por conta dos marcos iniciais para fluência dos efeitos legais.
Em caso de responsabilidade extracontratual, os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, segundo a Súmula 54 do STJ. Se a condenação decorrer de relação contratual, o termo inicial da contagem é a citação. Já quanto à correção monetária, o termo inicial é a data da prolação da decisão que fixou o seu valor, como dispõe a Súmula 362.
Como a Selic engloba juros moratórios e correção monetária, a incidência desse índice pressupõe fluência simultânea desses dois fatores, o que implica em evidente conflito com as súmulas 54 e 362.
Além disso, a taxa Selic não é um espelho do mercado, mas o principal instrumento de política monetária atualizada pelo Banco Central no combate à inflação. Tem forte componente político e é fixada com objetivo de interferir na inflação para o futuro, e não de refletir a inflação apurada no passado.
"Sua adoção na atualização de dívidas judiciais conduz a uma oscilação anárquica dos juros efetivamente pagos pela mora, com grandes distorções em relação ao mercado e injustiça gritante", destacou o ministro Salomão. Para ele, o uso da taxa fazendária abre hipótese de enriquecimento sem causa.
O uso da Selic, ainda segundo o relator, incentiva a recalcitrância recursal e desmotiva o uso de meios alternativos de resolução de demandas, como conciliação e mediação. Isso porque o devedor litiga ciente de que sua dívida não causará grande prejuízo. Por isso a aplicação dos critérios do artigo 161 do CTN.
Fonte: ConJur