Compartilhe

Dramatização de denúncia leva STJ a aumentar rigor em indenização contra TV

A violação da responsabilidade da imprensa ao retratar um caso criminal deve receber como resposta do Judiciário, mais do que uma indenização, uma sanção séria o suficiente para ser acreditada.

Para o ministro Noronha, caso julgado não tem paralelos na jurisprudência do STJ

Com esse entendimento, a 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado pela Rede Globo contra a condenação a indenizar dois homens incriminados em um episódio do programa Linha Direta exibido em 1999.

A atração tinha como mote a reconstituição de crimes notórios e o objetivo de fornecer pistas para as autoridades. As encenações feitas pelo Linha Direta renderam processos contra a emissora e a fixação de indenizações. Foi por meio delas que se discutiu o direito ao esquecimento no Brasil.

O caso apreciado pela 4a Turma foi considerado mais grave do que os demais e, por isso, merecedor de uma punição mais grave. Por maioria de votos, o colegiado manteve a indenização de R$ 300 mil para cada vítima, valor que, atualizado, ultrapassa R$ 2 milhões.

O processo trata de dois homens denunciados em Minas Gerais por abusos sexuais cometidos contra quatro crianças. Eles seriam falsos pastores que se vestiam de palhaços para cometer os crimes. O episódio foi exibido antes mesmo da instrução processual, que resultou na absolvição dos dois.

Apesar disso, eles ficaram com a pecha de "palhacinhos estupradores" graças à forma novelesca com que a história foi retratada, apresentando fatos como incontestáveis e com a inclusão de depoimentos de psicólogos, autoridades e pais das vítimas.

Relator, o ministro Antonio Carlos Ferreira entendeu que o valor fixado foi exagerado. Ele foi acompanhado pelo ministro Marco Buzzi,ae ambos ficaram vencidos.

Para eles, o montante de R$ 300 mil, correspondente a 645 salários mínimos na época do julgamento, não é proporcional à gravidade da ofensa e ao grau de culpa do causador dos danos. Assim, o relator propôs a redução para 250 salários mínimos, o equivalente a R$ 116,5 mil para cada.

Sanção deve ser dura

Abriu a divergência vencedora o ministro João Otávio de Noronha, para quem o caso não tem paralelos na jurisprudência do STJ. Não se trata de mera notícia veiculada ou narração de fatos criminosos mencionados na denúncia, mas da dramatização deles em programa de rede nacional.

Em sua análise, o Linha Direta usou "cores muito mais vivas que as da própria realidade". Isso gerou uma perseguição aos dois acusados, que ficaram marcados como criminosos. A absolvição deles apenas reforçou a inconsequência do programa e suas desastrosas consequências para a vida daquelas pessoas.

"Todos esses elementos, em seu conjunto, indicam que estamos diante de um caso odioso e sem precedentes. Portanto, a resposta deve ser dura, enérgica, para que seja eficaz, inclusive como prevenção", disse o ministro Noronha. "A sansão precisa corresponder ao grau de irresponsabilidade demonstrado", acrescentou ele.

Ao acompanhar a divergência, a ministra Isabel Gallotti afirmou que a indenização foi calculada pelas instâncias ordinárias levando em conta, inclusive, o valor cobrado pela emissora pelo espaço comercial nos intervalos do Linha Direta. Ela defendeu que o valor a ser pago por danos morais seja, no mínimo, equivalente.

"Qualquer coisa a menos do que aquilo que ela lucrou vendendo comercial nos intervalos do programa representa uma conta positiva para que se perpetue a existência de programas desse tipo; ou seja, se o valor é pequeno, isso serve de estímulo para a produção de novos programas do gênero", disse. Também votou com a maioria o ministro Raul Araújo.

REsp 1.770.391

Fonte: Conjur

 

 

Utilizamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência, de acordo com a nossa Política de Privacidade e, ao continuar navegando, você concorda com estas condições.
Prosseguir