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STJ abranda LPI para permitir que Dado e Bonfá usem a marca Legião Urbana

Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá formaram a Legião Urbana com Renato Russo em Brasília, em 1982

Por maioria apertada votos, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu abrandar o trecho da Lei de Proteção Industrial (Lei 9.279/1996) que confere ao titular da marca a exclusividade de seu uso, de modo a permitir que Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá possam se apresentar com o nome Legião Urbana.

O julgamento foi concluído nesta terça-feira (29/6), após voto de desempate do ministro Marco Buzzi. Ele acompanhou a divergência inaugurada pelo ministro Antonio Carlos Ferreira e formou maioria com o ministro Raul Araújo, a favor do guitarrista e do baterista da banda brasiliense.

Com o resultado, por 3 votos a 2, a 4ª Turma negou provimento ao recurso especial ajuizado pela empresa Legião Urbana Produções Artísticas, de propriedade do filho do vocalista e fundador da banda, Renato Russo. Trata-se da titular da marca, que pelo artigo 129 da LPI teria exclusividade de seu uso.

Dado e Bonfá poderão se apresentar com esse nome, embora a titularidade da marca ainda permaneça exclusivamente com a empresa. Por isso, seguem proibidos de explorar a marca, comercializar produtos, licenciar seu uso para terceiros ou mesmo zelar por sua integridade ou reputação contra atos de terceiro embora devam, sim, manter sua reputação, não podendo agir no sentido de prejudicá-la.

Registro da marca Legião Urbana pertence à empresa administrada pelo herdeiro de Renato Russo (centro)

A origem
A banda Legião Urbana a foi formada em 1982, em Brasília, e teve o pedido de registro do nome feito ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) pela empresa Legião Urbana Produções Artísticas em 1987, quando seus três integrantes eram sócios.

Posteriormente, Dado e Bonfá deixaram a sociedade, vendendo suas partes para Renato Russo, e abriram cada qual sua própria pessoa jurídica. O vocalista morreu em 1996. Em 2000, o pedido de registro da marca Legião Urbana foi deferido pelo INPI, e ela passou a pertencer à empresa herdada pelo filho de Renato Russo.

Mais de dez anos depois, Dado e Bonfá foram à Justiça pedir o reconhecimento da co-titularidade sobre a marca. Nessa ação, a 7ª Vara Empresarial da Comarca do Rio de Janeiro reconheceu ser incompetente para tratar de questões relativas ao registro, pois envolvem o INPI e devem ser analisadas pela Justiça Federal, mas decidiu que os músicos têm direito de usar o nome sem autorização do titular.

A sentença transitou em julgado sem recurso. Contra essa decisão, o herdeiro de Renato Russo ajuizou ação rescisória, que teve provimento negado nesta terça-feira pelo STJ.

Voto de desempate do ministro Marco Buzzi defendeu a flexibilizaçaõ da LPI no caso

Flexibilização da LPI
De acordo com o voto vencedor do ministro Antonio Carlos Ferreira, a sentença não privou a empresa comandada pelo filho de Renato Russo de titularizar a marca. Em vez disso, apenas garantiu a mera utilização exclusivamente no exercício de atividade profissional para Dado e Bonfá, levando em conta que se trata de banda para a qual efetivamente contribuíram para criação e popularização.

Esse entendimento foi reforçado pelo voto-vista do ministro Marco Buzzi, segundo o qual a sentença analisou a restrição da Lei de Propriedade Industrial, mas compatibilizou-a com os direitos autorais dos músicos que são compositores das canções e de identidade social e artística, levando em conta também o pleno exercício da atividade profissional.

Para Buzzi, a discussão desdobra-se dos limites do direito de propriedade, pois envolve patrimônio imaterial que também pertence a Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, e que sem eles não existiria. "A marca está profundamente enraizada na vida pessoal e profissional dos recorridos, que não podem ser tolhidos do direito de identificação com o nome que representa, em grande medida, suas carreiras profissionais e seus legados", afirmou.

Também pesou a interpretação de que o uso da marca Legião Urbana pelos seus ex-integrantes não vai gerar prejuízos ao detentor dela. Para a divergência, o efeito será o oposto: deve contribuir para que o legado se mantenha vivo e presente na memória do brasileiro, permitindo ainda que novas gerações tenham contato mais direto com a banda ícone do rock nacional.

"É dever do Judiciário, quando provocado, adotar solução que permita a harmonização dos interesses em conflito, o que pode levar, diante do caso concreto, a uma mitigação do atributo de exclusividade do uso da marca e a concessão de uma licença compulsória", concluiu o ministro Marco Buzzi, no voto-vista.

Voto vencido
Ficou vencida a relatora do recurso especial, ministra Isabel Gallotti, que foi acompanhada pelo ministro Luis Felipe Salomão. Para eles, a decisão da 7ª Vara Empresarial do Rio afrontou a LPI porque, apesar de se declarar incompetente para tratar do registro da marca Legião Urbana, acabou por limitar o direito de propriedade titularizado pela empresa e por afastar o atributo da exclusividade.

Na prática, o que a sentença fez foi realmente dar a Bonfá e Dado a cotitularidade, algo que dependeria de ato administrativo pelo INPI, sujeito ao crivo da Justiça Federal.

Para a ministra Isabel Gallotti, músicos podem tocar as músicas que fizeram para a Legião, mas sem usar o nome da banda

"Se entendermos que pode haver o uso desautorizado de uma marca concedido pela Justiça Estadual, estaremos privando de qualquer utilidade um instituto que não prescinde da formalidade de seu depósito perante o INPI, em rito leal que comporta possibilidade de impugnação o que não houve, no caso, inclusive porque à época todos integravam a pessoa jurídica", acrescentou.

A relatora também explicou que o julgamento não discute o direito de Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá continuarem tocando as músicas da banda Legião Urbana. "Eles podem tocar usando seu próprio nome", disse a ministra.

Isso porque não existe o direito social do público de continuar ouvindo a banda Legião Urbana. Para exemplificar, citou a situação de Paul McCartney, que segue tocando as músicas dos Beatles, mas sem utilizar esse nome. "É uma questão de proteção da marca, direito pautado na formalidade do registro perante o INPI", reforçou.

Fonte: ConJur

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